A Sociedade Anônima de Futebol (SAF) do Cruzeiro contrariou sua política de boas práticas de gestão e demitiu mais um treinador.
A saída do argentino Nicolás Larcamón, anunciada nesta segunda-feira (8), foi a terceira demissão no clube em menos de oito meses. Antes, saíram Pepa (agosto de 2023) e Zé Ricardo (novembro de 2023).
Contando apenas o intervalo entre às saídas dos comandantes efetivos, o Cruzeiro demite um treinador a cada quatro meses (116 dia).
Larcamón foi o quarto treinador contratado pela SAF cruzeirense desde 2022, quando o grupo comandado por Ronaldo assumiu a gestão do clube. Foram eles: Paulo Pezzolano, Pepa, Zé Ricardo e Nicolás Larcamón.
Nesse período, o Cruzeiro também foi dirigido pelos interinos Fernando Seabra, então comandante do time sub-20, e Paulo Autuori, contratado para ser diretor técnico. A dupla comandou a equipe azul na reta final do Campeonato Brasileiro de 2023, após a demissão de Zé Ricardo, ocorrida em novembro do ano passado.
Agora, os dirigentes estão em busca do quinto treinador para o clube. Alguns nomes estão em pauta, como o argentino Luis Zubeldía, campeão da Copa Sul-Americana pela LDU, do Equador, em 2023.
Técnicos da “era SAF”
De todos os técnicos que comandaram o Cruzeiro até aqui na “era SAF”, apenas Paulo Pezzolano não foi demitido. No início de 2023, a direção da SAF decidiu manter Pezzolano até o fim do Campeonato Mineiro. Isso, mesmo com a ciência de que o treinador não ficaria para o restante da temporada.
O uruguaio já havia informado à cúpula celeste, desde a conquista da Série B do Campeonato Brasileiro, que deixaria a Toca da Raposa II.
Paulo Pezzolano foi o primeiro técnico da “era SAF” no Cruzeiro. Ele dirigiu o clube entre 3 de janeiro de 2022 até 19 de março de 2023 (um ano e três meses). A saída do treinador não foi por demissão, mas, sim, um acordo com a direção do clube.
Para a vaga do uruguaio chegou o português Pedro Miguel Marques da Costa Filipe, conhecido como Pepa. Ele foi anunciado oficialmente como treinador do Cruzeiro no dia 20 de março de 2023. Sua saída aconteceu no dia 29 de agosto do mesmo ano, menos de cinco meses depois de sua contratação.
A primeira grande ruptura no discurso
Em março, ao escolher Pepa para suceder Paulo Pezzolano, a direção do Cruzeiro adotou o discurso de “continuidade”, uma vez que o português tinha uma metodologia de trabalho muito parecida à do uruguaio.
“O Pepa é um passo de continuidade, não existe uma ruptura na metodologia. Existe uma continuidade e alguns ajustes estratégicos. A gente entende que o Pepa deve fazer alguns ajustes.. Mas não estamos vendo nenhuma mudança conceitual, o perfil de trabalho é muito parecido. Nosso principal receio era encontrar alguém que mantivesse o nível de exigência e cobrança do Pezzolano, e isso o Pepa tem”, disse o diretor de futebol Pedro Martins.
A primeira grande ruptura no discurso da gestão do futebol da SAF foi justamente a demissão de Pepa em 29 de agosto, após apenas 25 jogos. O técnico português se mostrou surpreso com o desligamento, pois tinha a promessa de fazer um trabalho longevo e que seria respaldado pela direção.
Em entrevista à TV Globo após sua saída, Pepa lamentou a quebra do discurso do clube. “A única coisa que me senti foi um pouco desapoiado. Você treina o Cruzeiro, com 11 milhões de torcedores, uma paixão louca. De repente, tchau, acabou. Se fosse por confusão com jogadores, com direção, com más exibições… Aí, sim. É uma grande mágoa. Da mesma forma como foi explicado sobre a força do projeto, se em algum momento acontecesse de perder por 3 a 0, chegar e falar: meus amigos, esse é nosso treinador, é ele até o final da temporada. Seja com 3 a 0, 4 a 0, 5 a 0, ele vai ser nosso treinador, porque foi escolhido e nós acreditamos. Por que não foi feito isso? Se não foi feito, não acreditam que daria. Eu acreditava 100%. Mas, quem tem a faca e o que na mão, não acreditou”.
A longevidade no trabalho dos técnicos, inclusive, era uma das premissas no discurso da SAF. Antes de assumir o Cruzeiro, Ronaldo criticou as mudanças seguidas de treinadores no futebol brasileiro.
“Há várias coisas que você pode pedir ao treinador. É uma busca complicada. No Brasil, do jeito que fazem, ninguém faz isso. Mandam embora um, outro, só vão trocando. Ninguém chega ali: ‘amigão, quero que meu time jogue assim, que a torcida fique feliz e se divirta’. Não tem”, comentou o Fenômeno no Flow Podcast.
Pepa deixou o Cruzeiro na 12ª posição do Campeonato Brasileiro, com 25 pontos em 21 rodadas. Foram sete vitórias, oito empates e dez derrotas. O aproveitamento geral do português no clube foi de 38,66%.
A segunda grande ruptura do discurso
Depois de um jogo sob o comando do interino Fernando Seabra, o Cruzeiro surpreendeu na escolha do substituto de Pepa. O nome anunciado foi Zé Ricardo.
Naquele momento, a direção de futebol rompia com um dos pilares do seu discurso: a manutenção de metodologia de trabalho dentro da Toca da Raposa. A chegada de Zé Ricardo representou a ruptura com o modelo de jogo implantado por Paulo Pezzolano desde 2022 e mantido por Pepa.
Também ao Flow Podcast, Ronaldo afirmara que mudar a ideia de jogo era algo inegociável. “O trabalho do dirigente na hora de contratar um treinador é importantíssimo. O treinador normalmente vem e já tem aquela ideia de que: ‘eu vou e farei tudo do meu jeito’. Mas acho que os clubes cada vez mais têm que buscar a identidade e as características de um treinador que o clube quer”.
O Fenômeno prosseguiu: “No diagnóstico que fiz com o Paulo André, ele chegou para mim e perguntou: ‘como você quer que seu time jogue?’. Eu disse: quero que meu time jogue para frente, seja vertical, compacto, saia em contra-ataque, tenha jogadores rápidos e características que o clube pode determinar para entregar ao treinador. Quero que meu time jogue para frente, seja protagonista, ter a posse de bola, fazer muitos gols, sofrer menos, me divertir, que a torcida se divirta”.
Definitivamente, esse nunca foi o estilo dos times de Zé Ricardo ao longo de sua trajetória como treinador. Mais além do que romper com o discurso de “trabalhos longevos e respaldados pela direção” na saída de Pepa, o Cruzeiro deixou de honrar naquele momento com a “ideia de jogo pensada para a SAF”.
Sem explicar a “mudança conceitual”, o diretor de futebol Pedro Martins argumentou sobre a decisão de trocar Pepa por Zé Ricardo. “A decisão de ficar é um risco, a de trocar também é um risco. Por isso temos que ter clareza em cada passo. Não chegou um salvador da prática, como também não existia antes. É colocar a mão na cabeça e tomar as melhores decisões para obter os melhores resultados”.
Sem convicção, SAF do Cruzeiro age como associação
Se Pepa se surpreendeu ao ser demitido após 25 jogos, Zé Ricardo durou apenas dez partidas à frente do Cruzeiro. Para pessoas próximas, o treinador carioca admitiu a surpresa ao ser desligado no último domingo (13), após a derrota para o Coritiba, por 1 a 0, em Curitiba, realizada no sábado (12).
A convicção do departamento de futebol em Zé Ricardo durou 69 dias.
O treinador carioca comandou o Cruzeiro em dez partidas do Campeonato Brasileiro, com três vitórias, dois empates e cinco derrotas. O aproveitamento dele no cargo foi de 36,66%.
Zé Ricardo deixou o comando celeste com o clube na 17ª colocação do Campeonato Brasileiro, o primeiro na zona de rebaixamento, com 37 pontos.
A direção só se pronunciou sobre a decisão de desligar mais um treinador em 2023 por meio de uma nota.
Interinos como tampões
Depois da saída de Zé Ricardo, Fernando Seabra e Paulo Autuori dirigiram o Cruzeiro até o fim da Série A de 2023. Juntos, os dois alcançaram duas vitórias (Fortaleza e Goiás) e três empates (Vasco, Athletico-PR e Botafogo), em cinco partidas. A campanha da dupla salvou o clube do rebaixamento.
Chegada de Larcamón
Anunciado pelo Cruzeiro no fim de dezembro, Nicolás Larcamón dirigiu a equipe em 14 jogos, com sete vitórias, quatro empates e três derrotas. Nesse período, o time celeste fez 21 gols e sofreu 13. O aproveitamento foi de 59,52%.
O contrato do treinador havia sido assinado até dezembro de 2025.
Este conteúdo foi criado originalmente em Itatiaia.
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