Você reparou que alguns filtros sumiram das redes sociais? Pois é, a retirada dos filtros no Instagram e Facebook gerou discussões sobre o impacto dos efeitos de beleza na autoestima e na percepção da realidade.
A Meta, empresa responsável pelas plataformas, alegou motivos econômicos para a mudança, mas isso trouxe à tona o debate sobre o uso cada vez mais comum em conteúdos digitais. A CBN foi entender como os usuários estão lidando com essa mudança.
“De certo modo, eu vou me incomodar um pouco porque alguns filtros escondiam as minhas espinhas persistentes, a minha olheira, as minhas rugas, corrigiam minha sobrancelha e eu me sentia um pouco mais apresentável. Mas eu não tenho problema nenhum em ser vista assim, de cara limpa. E isso para você? Te incomoda ou não faz diferença nenhuma?”
Essa é a Jéssica Alves, que compartilhou em suas redes sociais uma reflexão sobre a recente retirada de mais de 2 milhões de filtros do Instagram e do Facebook. A mudança nas redes sociais levantou o debate sobre o vício em perfeição digital e a obsessão por uma “imagem ideal”.
A alteração também despertou uma reflexão em Carolina Cruz, de 27 anos. Ela fazia postagens frequentes com filtros de maquiagem em seu perfil, mas acredita que a redução dos efeitos disponíveis será positiva.
“O fim dos filtros me fez pensar que é uma oportunidade para começar a dar um basta na dismorfia corporal que a gente passou a desenvolver com as redes sociais, porque tudo é tão artificial. Então, num mundo falso de filtros, a gente passa a perder a autoestima, perder a noção também do que é realidade”, relatou.
A Meta, dona das redes sociais, justificou que, por motivos econômicos, descontinuou a plataforma que permitia a criação dos filtros por usuários. Porém, outros efeitos que modificam a imagem ainda estão disponíveis em aplicativos e redes sociais. Inclusive, centenas de usuários já compartilharam vídeos ensinando maneiras de substituir os filtros deletados.
A psicanalista Monica Seincman avalia que, para muitas pessoas, os filtros se tornam uma necessidade porque funcionam como uma “máscara”.
“Eu acho que é uma coisa que mexe com o caminho que a gente tem trilhado em termos de cultura. A questão da imagem é se transformar num produto, num produto desejável, se transformar no ideal. Seria como se a máscara estivesse colada no rosto e, se você tira, já não é mais você. Então, não é uma vaidade, eu vou dar uma realçada naquilo que me fotografa só do lado direito, esquerdo, sei lá. Não tem isso. Eu sou isso daqui”, analisou.
O impacto da retirada dos filtros é ainda mais intenso para as gerações mais jovens. A influenciadora de beleza Dora Figueiredo, de 30 anos, avalia que, para aqueles que cresceram na era das redes sociais, diferenciar a linha entre o real e o virtual se torna ainda mais difícil.
“A gente já sabe que isso não vai mudar. Mas acho que é um momento importantíssimo para a gente discutir isso e trazer esse assunto à tona e falar quanto os filtros são prejudiciais, principalmente para as crianças. Eu tenho 30 anos, quando a gente era mais novo tinham as capas de revista, mas a gente sabia que era tudo retocado. Mas, quando olhava em volta, todo mundo era normal, todo mundo tinha espinha, todo mundo tinha o corpo normal. Era difícil? Era, mas agora é muito mais”, disse.
O pedagogo e mestre em educação Geraldo Junio observa uma mudança no comportamento de crianças e adolescentes por causa do uso excessivo de filtros.
“A gente vive o tempo todo sobre o olhar do outro. A forma como os outros nos percebem começa a influenciar fortemente a nossa maneira de ser. O problema não é os outros nos perceberem através da nossa imagem. É a gente começar a mudar a nossa imagem pela forma como a gente quer que as pessoas nos percebam. Na escola, às vezes, é até um problema. Como as fotos não têm esse tratamento, pessoas que estão ali viciadas no filtro, você percebe direitinho que nessas fotos coletivas, ela se posiciona de uma forma diferente. Quando ela tem foto que pode tratar, ela está ali na frente, está aparecendo, está em destaque. Quando você vê que é uma foto que não vai ter tratamento, a pessoa vai para o fundo, se esconde”, afirmou.
Para Carlos D’Andreia, professor de Comunicação da Universidade Federal de Minas Gerais, qualquer alteração no uso dessas plataformas acaba se tornando uma pauta de debate público.
“O Instagram é, hoje, uma porta de entrada para praticamente tudo. Acho que é virtualmente impossível ou muito difícil, pensar uma empresa, de qualquer porte, que não tenha um perfil no Instagram, não necessariamente utilizando o filtro. O filtro é uma das várias camadas que estão colocadas nessa relação. Mas isso vai se complexificando até pensar nessas várias instituições públicas, que vão se envolvendo nessa história, então se torna, por exemplo, uma questão de saúde ou de saúde pública, como já vem demonstrando algumas pesquisas que apontam para esse uso excessivo, essa distorção da autoimagem e o incômodo que essa dependência nos gera, vai ficando mais visível em situações como essa”, disse.
O Instagram foi o aplicativo mais baixado do país em 2024, com mais de 65 milhões de downloads, segundo dados da consultoria AppMagic. Além disso, o brasileiro dedica, em média, 3 horas e meia por dia às redes sociais.