A atleta dos saltos ornamentais, Ingrid Oliveira, eliminada nos Jogos Olímpicos de Paris na última segunda-feira (5), publicou vídeos em sua conta no Instagram, nesta sexta (9), nos quais desabafa sobre sua saúde mental.
A saltadora ainda expôs ter vivido um relacionamento abusivo. A brasileira revelou não estar bem psicologicamente e fisicamente. Segundo Ingrid, o vídeo foi gravado no início do mês de julho.
“Evoluir também é deixar ir, e enfrentar meus maiores medos e encará-los de frente, sem medo de me expor a coisas que um dia me feriram, me fizeram chorar e tiraram meu sono à noite. Deixar ir tudo que um dia já me machucou é o maior ato de amor que eu poderia fazer para mim mesma”, escreveu na legenda.
“Fiz esse vídeo no dia 6/7, e desde então refleti se postava ou não esse desabafo, se valeria ou não a pena expor coisas que sempre guardei para mim, mas vi que guardar tudo me fez adoecer. Então estou aqui, expondo coisas que ninguém nunca saberia, que muita gente passa por isso no off, porque não quero mais que isso assombre minha mente”, iniciou.
Saúde mental no esporte
Ingrid revelou lidar com problemas psicológicos causados pela rotina de atleta. A saltadora disse lidar com a condição há alguns anos.
“O meio esportivo é assim. Não que a gente não possa se expressar, mas isso pode soar como fraqueza. Não pelo que as pessoas acham, mas o que a gente mesmo acha da gente. Quando a saúde mental não está bem, não é sobre os outros, é sobre a gente. A gente se sente fraco de não conseguir lidar, e tem tanta gente que consegue lidar tão bem com as coisas. Pelo menos é como eu me sinto”, disse a brasileira.
“Só eu sei das minhas batalhas e dores, e consegui passar. Talvez não da forma ideal, porque hoje em dia eu estou assim. Na época, parecia a coisa certa e que eu tinha superado. Se você não lida da forma correta, uma hora a conta chega. Há vários anos não me sinto bem psicologicamente, emocionalmente, e fisicamente, com lesões”, contou.
Experiências passadas
Paris 2024 é a terceira Olimpíada de Ingrid. A atleta contou encontrar forças para treinar em conselhos da mãe, já falecida.
“Quando minha mãe morreu, em 2013, no dia seguinte eu já estava treinando. Eu tinha uma coisa muito certa na minha cabeça, que era me classificar para os Jogos Olímpicos de 2016 porque era o sonho da minha mãe me ver lá”, disse.
Ainda sobre os Jogos Olímpicos do Rio 2016, a competidora dos saltos ornamentais relembrou a polêmica vivida durante o período olímpico.
“Consegui! Apesar de não ter sido uma Olimpíada ideal. Bem longe do que eu imaginava diante de tudo o que aconteceu lá, diante de erros, confusões e polêmicas. Foi a minha primeira Olimpíada, eu tinha 19 anos, e o que restou depois foi uma Ingrid quebrada emocionalmente. Mas eu lidei como tudo que lidava na minha vida e só ignorei e tentei seguir em frente”, disse.
“Estar passando por isso é uma consequência, óbvio. Eu estava ignorando todos os ataques e ameaças contra mim, minha treinadora e alguns amigos meus. A maioria das pessoas ficou com raiva de mim, e eu só tinha 19 anos, e não sabia lidar com muita coisa. Tanto que demorei anos para contar o que realmente aconteceu. Tinha muita gente dando pitaco em coisas que não sabiam. Não estou me isentando da responsabilidade, mas sei o que fui fazer na Olimpíada, e não foi aquilo”, afirmou a atleta.
Na época, Ingrid e Pepê Gonçalves, da canoagem slalom, foram punidos pelo Comitê Olímpico do Brasil (COB), após passarem uma noite juntos. Os dois ficaram no quarto da carioca. Ela dividia o alojamento com a dupla de salto, Giovanna Pedroso.
As duas já estavam passando por maus bocados durante os Jogos. Elas competiram a classificatória brigadas e, após o acontecimento com o canoísta, Giovanna fez reclamações formais sobre a colega para o COB.
“Depois de 2016, o que eu mais queria era continuar e mostrar para as pessoas quem eu era, que não era aquilo que elas estavam falando. Esse, para mim, é o maior propósito na vida”, revelou Ingrid.
Em Tóquio 2021, Ingrid também não teve uma boa experiência. A atleta vivia um momento conturbado na vida fora da piscina. Ela revelou ter passado por um relacionamento abusivo e ter pensado em atentar contra a própria vida.
“Eu vivia um relacionamento extremamente tóxico, onde eu era constantemente invalidada e abusada do meu psicológico, do que restou dele. Foi o ano que realmente achei que fosse morrer, e de fato eu queria. Eu tentei. Eu tentei acabar [com a própria vida] três vezes. Tive muita pressão do meu ex para não externar isso”, desabafou.
Ela ainda revelou ter incentivo de pessoas próximas para terminar a relação.
“Falavam para eu terminar porque eu iria acabar morrendo, e iria acabar acontecendo porque eu não queria mais viver. Todo mundo falava que eu não precisava daquilo. Eu sabia, mas não conseguia me libertar. Acabei criando uma dependência emocional. Foram tantas coisas que vivi. Abuso emocional, físico, agressão… na parte esportiva, comecei a ter lesões porque meu corpo começou a reagir. Foi um ano e meio vivendo isso”, contou.
Entretanto, o término só foi concretizado em 2022, após o ex-namorado bater nela durante sua festa de aniversário, em frente aos convidados.
“Para ele falar que não me bateu, ele pegou a minha mão e deu um tapa na minha cara. E foi só ali que tive coragem [de terminar], porque todo mundo viu o que aconteceu. Acho que se ninguém tivesse visto, provavelmente eu estaria até hoje com ele. Tudo que ele fazia, revertia os papéis e falava que era culpa minha. Ele tentou convencer uma amiga minha de que eu tinha batido nele. Ela disse ‘se eu não tivesse visto, ele iria me convencer’”.
“Ele tentava me convencer de que era a melhor pessoa para mim, que ninguém nunca iria me amar da forma que ele me amava, e que eu que causava isso, que ele só reagia à minha forma. E eu não fazia praticamente nada. Eu nunca fui ciumenta. Eu sempre fui estressada. Isso, sim. Terminei com ele, e consegui tirar um peso gigante das minhas costas”, completou.
Diagnóstico
A atleta revelou ainda ter sido diagnosticada com depressão. Ela disse não conseguir se alegrar mesmo em caso de vitórias nos saltos ornamentais.
“Então, veio a depressão, com a qual fui diagnosticada. No fundo, eu já sabia porque não me sentia mais a mesma Ingrid de 2016. Por trás da máscara de que estava tudo bem e que eu estava feliz, tinha uma Ingrid toda destruída por dentro. E tem o lado da vergonha. Eu fingia que estava bem”, disse.
Ingrid Oliveira em Paris
Ingrid Oliveira foi eliminada da Olimpíada de Paris 2024, na última segunda-feira (5). A atleta conseguiu o total de 255.90, marca bem abaixo das suas últimas participações olímpicas (281.90 em Tóquio 2021 e 261.20, na Rio 2016).
A saltadora errou a execução do salto da plataforma de 10m e não conseguiu se classificar para as semifinais. Em entrevista ao Sportv, ela revelou ter ficado abalada com a não participação do seu parceiro, Isaac Souza, cortado por lesão.
“A eliminação do Isaac me abalou bastante. Quando eu classifiquei em Fukuoka, abracei ele e disse: ‘Não me deixa sozinha na Olimpíada’. Aí aconteceu a lesão”, disse chorando, após a prova.
“Todo mundo falou para não me abalar com isso, inclusive ele mesmo, mas acho que é muito difícil”, contou.
“Fiz muito diferente das outras, fiquei no quarto e só saía para comer com meu treinador. Estava 100% focada em dar o meu melhor e saltar por mim e pelo Isaac, mas, infelizmente, não consegui”, contou a atleta aos prantos.
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